Na Tenda da Estrela se reúnem os griôs/MC's quando afinam suas almas com a terra e com o céu.
Mas é noite. A Torre ruiu. A dama do flow está vulnerável.
É tempo de espera, esperança, e cuidado com o território.
Atenção! É noite.
Outro rapper carioca que cantou recentemente na Tenda da Estrela foi o Black Alien.
Uma participação com o Elo da Corrente, em Veias Abertas
Escutem
e vejam:
Pra Tenda da Estrela tem que se perder no meio do mato. Na mata.
Se reencontrar com a atenção e resistência dos índios.
O
advogado Miguel Nagib redigiu o PL chamado Escola Sem Partido,
atendendo o desejo dos Bolsonaro, sob o argumento de que muitos
professores estavam sendo antiéticos e de que os estudantes estavam
sendo desrespeitados em suas opiniões. Dizem, os defensores do
Escola Sem Partido, que a doutrinação ideológica é o grande
problema da desvirtuação moral que vivemos. O Brasil está fora dos
trilhos por falta de um pulso firme e um alinhamento de caráter,
coisas que todo bom Pai de família tem. E se o filho deste Pai
começar a contestar os valores éticos e morais da própria família?
Certamente é culpa dos professores degenerados que estão fazendo
doutrinação ideológica ao invés de ensinar os conteúdos, afinal,
assuntos como discriminação racial ou violência de gênero, nunca
fizeram parte das jantas na família do Pai. Isso explica tão bem a
tristeza de ver a família partida. Querem tirar a graça de todas as
piadas do bom Pai com essa história de “politicamente correto”.
Isso é mimimi, dizem. Daqui a pouco a filha vai chegar querendo
apresentar a namorada, e tudo o que o Pai quis ensinar ruiu. Já não
chega a putaria da televisão, agora escola é lugar de TRAVESTI?!
Reparem
que o movimento Escola Sem Partido, que no caminho de sua expansão
nacional também quer se estabelecer em Londrina, fala sempre ao Pai
de família. Diz que vai proteger seu reinado, mesmo que diga isso
pra mãe, pra filha ou pro filho, é pra eles dizerem pro Pai. A
mensagem, em qualquer “debate público sobre o tema”, é pra
tranquilizar o coração do chefe da casa. E o coração desse Pai
anda tão aflito, temeroso com seu futuro e de seus filhos, indignado
com a corrupção dos políticos, de todos os políticos, mas
principalmente do Lula e do PT, que é muito razoável esse Pai
acreditar que os professores possuem partido sim, pois afinal, quando
estávamos sob a “ditadura do PT” os alunos não ocupavam as
escolas pra fazerem manifestações. E estas ocupações onde os
jovens ficam sozinhos, são só putaria pra atrapalhar quem quer se
formar logo. Tudo vagabundo! Teve até Pai que matou o filho por ter
certeza que isso não dava mais pra tolerar. Um absurdo! E se matou
também.
O
próprio nome Escola Sem Partido é uma mentira. Dizem que não
possuem partido ou intenções ideológicas, e buscam esconder dos
Pais siglas como PSC e MBL. FIESP e DEM agradecem. Aqui em Londrina, por exemplo, a
militância do Escola Sem Partido – que mira também a “proteção”
dos estudantes de ensino superior, tratando-os ainda como incapazes
de reflexão autônoma e massa de manobra – articula-se com o
movimento Filhos da UEL. Isso sem contar a articulação das escolas
com a Guarda Municipal (que tão bem recebeu o Jair Bolsonaro),
movimento que já está acontecendo. O Escola Sem Partido é, sem
sombra de dúvida, o primeiro projeto educacional do governo
totalitário que ameaça o horizonte do Brasil. Mas eles não contam
isso, é claro. Um projeto educacional que narra Paulo Freire
(educador de reconhecimento internacional) como um monstro e é
apoiado por Alexandre Frota (aplaudido em programa popular ao
confessar o estupro de uma Mãe de Santo). Eles estão querendo te
enganar, ó Pai. E sabem muito bem o que dizem.
III
Uma
opinião bem formada conhece os vários argumentos, correto?
Não
preciso de plaquinha na sala me dizendo que eu DEVO mostrar os vários
pontos de uma questão. Mostro quando sinto e acho propício ao
desenvolvimento d@ estudante que é meu mano, minha mana, meus irmãos
e irmãs. Talvez eu seja um irmão mais velho, mas não sou Pai dos
alunos. E nem o Estado é meu Pai. Posto isso, reflitamos sobre os
tais deveres do professor que o projeto de lei quer fixar nas
Escolas.
Dever
1:
O
professor não se aproveitará da audiência cativa dos alunos para
promover os seus próprios interesses, opiniões, concepções ou
preferências ideológicas, religiosas, morais, políticas e
partidárias.
Consideração: Toda a minha experiência de ensino, bem como a que
me chega por meio de relatos dos próximos, é permeada por
versículos bíblicos nos quadros e orações nas salas dos
professores. Anos entrando em sala de aula e recebendo a pergunta de
se eu era católico ou evangélico. A maior doutrinação religiosa
da escola brasileira é cristã. O Pai que se ampara neste texto para
cobrar qualquer coisa do professor desconhece o processo dialógico
de construção do conhecimento. O professor não tem tanta moral
assim com seu filho, não. A menos que esteja faltando Amor no lar, e
o ser humano que trabalhe como professor de seu filho seja alguém
mais amável que os que ele possui em casa.
Dever
2:
O
professor nem favorecerá nem prejudicará os alunos em razão de
suas convicções políticas, ideológicas, morais ou religiosas, ou
da falta delas.
Consideração: O que é favor ou prejuízo em sala de aula? Notas?
Dar uma nota baixa para um conhecimento não aprendido é um favor.
Prejuízo é o preconceito. Uma vez, durante uma aula de Educação
Musical, em que debatíamos estratégias de ensino para um conteúdo
básico da música popular brasileira, que é a história e os
fundamentos do samba, eu perguntei para a turma o que eles
compreendiam ser os Orixás. Uma estudante disse – estávamos em
roda e ela se sentiu livre para dizer – que, amparada em mais de 10
anos de leituras da Bíblia, ela tinha certeza em afirmar que Orixás
eram demônios. Se eu não corrigir este equívoco cotidiano em sala
de aula, aí sim estarei prejudicando seu filho.
Dever
3: O professor não fará propaganda político-partidária em sala de
aula nem incitará seus alunos a participar de manifestações, atos
públicos e passeatas.
Consideração: Quem vai dizer o que é e o que não é “propaganda
político-partidária” é o recorte descontextualizado das
múltiplas práticas pedagógicas de um profissional, gravado em
vídeo e exposto como espetáculo na internet? Uma das motivações é
bloquear a vinculação do nome Bolsonaro ao fascismo, que se diz
caluniado e perseguido pelos professores esquerdistas. Mas não
apontar que um indivíduo esteja mantendo ideologias fascistas é o
verdadeiro prejudicar o aluno e a sociedade, e é sintomático que
neste contexto de agravamento da crise política e social brasileira,
surja um movimento que quer calar a boca dos professores, pois os que
dão nomes aos bois podem atrapalhar o plano de poder conservadorismo
insurgente. E vão dizer que consciência é incitação aos alunos?
Oras, “Quantas ruas um homem deve parar antes que o chamem de
homem?” Mais ou menos assim o Nobel de literatura, Bob Dylan,
inicia sua célebre canção.
Dever
4: Ao tratar de questões políticas, sócio-culturais e econômicas,
o professor apresentará aos alunos, de forma justa – isto é, com
a mesma profundidade e seriedade -, as principais versões, teorias,
opiniões e perspectivas concorrentes a respeito.
Consideração: Exercitar o ambiente polifônico dentro da sala de
aula não tem nada a ver com obedecer a um “dever”, que mais
parece um mandamento divino, de dar a “mesma profundidade ou
seriedade” no tratamento de todas as opiniões sobre um dado tema.
Muitas vezes o mais justo não é isso, e sim reforçar ou corrigir
algumas compreensões sobre determinados assuntos, ainda imaturos por
parte dos alunos. O pensamento de medo e intolerância ao diferente,
que desemboca nos movimentos fascistas, e que está presente em
vários discursos bastante difundidos em nossa sociedade atual, não
é uma questão de teorias divergentes sobre a realidade, meros
pontos de vista, e sim um equívoco de pensamento a ser corrigido
também na escola.
Dever
5: O professor respeitará o direito dos pais a que seus filhos
recebam a educação moral que esteja de acordo com suas próprias
convicções.
Consideração: Um dos fatos mais comuns em contexto escolar, durante
aulas de Educação Musical, é a risada de zombaria e deboche,
acompanhada da fala “é música de macumba!”, em resposta à
qualquer audição de música com tambores ou percussão mais
expressiva. De que espécie de “respeito” este “dever”
proposto pelo PL se refere? Qual é esta moral de casa que não deve
ser contraposta pelo professor? Este item cria o mecanismo legal para
amparar que os estudantes não permaneçam em aula, quando alegarem
que qualquer atividade proposta pelo professor vai de encontro com as
convicções morais da família. Isso, de maneira diluída, já
acontece mesmo sem a tal plaquinha de deveres. E novamente o que me
chegam são relatos de casos de professores que não conseguem
trabalhar conteúdos específicos – percussão no Maracatú, por
exemplo – por resistência dos pais dos alunos, que proibiam seus
filhos de aprender! Que tristeza, tantos pais e mães perdidos,
querendo exercer o poder (que a sociedade lhe tira) no controle dos
filhos. Se dessem as mãos, pais e filhos, e caminhassem juntos seria
tão mais bonito, os pais se transformando, aprendendo eternamente,
junto dos filhos e da escola. Mas não, todo Bom Pai de família sabe
o que é o certo, o correto e o de Deus, e o que é bom é bom e o
que é ruim é ruim e ponto.
Dever
6: O professor não permitirá que os direitos assegurados nos itens
anteriores sejam violados pela ação de terceiros, dentro da sala de
aula.
Consideração: E depois do professor bem amordaçado, esse
derradeiro item tampa a brecha de terem figuras convidadas durante as
aulas, que possam eventualmente subverter as visões de mundo os
alunos. Na prática fecha assim: o professor não pode colocar o
aluno pra pensar, deve apenas lhe transmitir informações técnicas,
e não pode deixar ninguém que não possua o mesmo código de
fidelidade à insensatez do Estado dialogar com os estudantes,
devendo manter-se vigilante para que os mesmos continuem sem pensar.
IV
E
ficou de terminar o texto hoje, dia dos pais. Está chovendo. E os
meninos estão elétricos e por perto. Eu preciso de silêncio, eles
precisam se expressar, gastar energia. As vezes me interrompem, me
chamam a atenção, até que grito: Pô, gente, fiquem quietos aí!
Já expliquei que preciso me concentrar. Diminuem a bagunça. Logo o
tumulto se reinicia. Eu repito a cena, com pequenas variações. E
vamo que vamo, estão felizes, crescendo, e é isso que importa, não
meu controle ou meu poder de silencio. Um dos meus filhos está aqui
agora, de castigo. Não teve como, os dois juntos não controlam o
corpo, a voz. Mas está de boa, explorando a sombra da mão com uma
lanterninha. Acabando o parágrafo você pode voltar lá, junto do
seu irmão, explico. Pronto, acabou, vai, mas fica quieto, blz!? Mas
agora eu prefiro ficar um pouco mais, ele me diz. Tudo bem.
Uma
cena como esta contém muitas relações com dramas educacionais
cotidianos. Qual a força da palavra de ordem dos professores? Como
os professores lidam com suas necessidades pessoais de controle – o
autoritarismo é uma desmesura frequente em professores dos mais
diversos matizes ideológicos – e por quais vias exercem suas
funções de autoridade nos grupos? Essas são algumas questões que
estão presentes na formação dos professores. Professores que não
estão sempre certos, assim como também os pais erram. E, cá entre
nós, como erram os pais! Tadinhos, erramos mesmo. Muitas vezes não
sabemos das coisas e temos que fazer cara de que temos tudo sob
controle.
Se
a Escola pública do país enveredar realmente pelas vias de
descrédito ao professor, que o Escola Sem Partido impõe como
consequência direta, teremos sim uma grande máquina de ilusão,
incapaz de refletir a sociedade e a vida que a envolve. Maquiar as
contradições, as dores, os erros. Não existe machismo, nem nunca
houve ditadura, escravidão foi uma história de muito tempo atrás,
e racismo é fantasia. O Pai deve estar sempre certo. Vamos celebrar
o dia dos pais nas escolas, e sorrir na cara das formas familiares
onde o pai não consta – bloqueando um movimento global de
conscientização e sensibilização dessa questão por parte dos
professores, que vêm eliminando estas datas de seus eventos.
A
Escola irá, se caminhar para as propostas "sem partido",
se distanciar da realidade vivida na sociedade. E pior,
culpabilizará – de maneira alucinatória e delirante – todas as
minorias pelas sequelas da sociedade: a culpa do mundão tá virado é
dessa viadagem toda, falta de princípios morais; a violência é
culpa desses vagabundos, que só querem saber dos direitos humanos;
os problemas econômicos são culpa dos corruptos, que são os
políticos, nunca os empresários. Todas respostas que se distanciam
da realidade, só para protegerem a visão heroica da paternidade.
Visão amparada na certeza da razão dos valores do Pai, presente em
muitos seios familiares. Retirar o debate sobre sexualidade com os jovens do e no espaço Escolar, como o proposto pelo ESP, é deixar toda uma população desamparada. Crescem
os casos de HIV entre a juventude, bem como os casos de homofobia e
transfobia. Onde deveríamos ter Luz querem jogar Trevas. E assim vai. Escravidão, machismo, classes sociais, vamos jogar tudo pra debaixo
do tapete só por serem temas que atrapalham nossas refeições. Ainda temos refeição. Mas como serão os seres humanos que sairão de escolas assim?
Uma massa completamente desconectada de seus desejos e pulsões,
pronta – quando muito – para sub-empregos (esse é o rumo de todos os empregos depois
dos retrocessos trabalhistas e da previdência) e uma situação de completo abandono social (lembremo-nos do congelamento de investimentos dos
próximos 20 anos). Como seremos daqui 20 anos? A pior faceta da Escola é esta: a que atente ao cruel plano de gerar
mão de obra barata, dizimando as culturas e sabedorias locais.
Atuando pelo mundo, transformando jovens de tribos com conhecimentos
ancestrais em marginalizados. O poeta e sábio Rabintranath Tagore
reflete sobre a educação – inglesa – na Índia da seguinte
forma: “A escola forçosamente arranca as crianças de um mundo
repleto de artesanatos de Deus. É um mero método de disciplina, que
se recusa a levar em consideração o indivíduo, uma fábrica para
gerar resultados uniformes. Eu não fui uma criação da direção
escolar: o Ministério da Educação não foi consultado quando eu
nasci neste mundo.”. Poderia ser o relato do estranhamento dos
indígenas à educação escolar. Uma escola muito diferente da imaginada pelo educador Paulo Freire.
Vale lembrar que o autor da Pedagogia da Autonomia, o grande
alfabetizador, é uma das figuras pintadas como sendo quase o
capiroto pelos membros do ESP. A Escola como espaço de debate aos
temas caros à comunidade, esquece. Vai ser considerado doutrinação
ideológica e incitação à manifestações políticas se o
professor começar a trabalhar com a pauta dos conflitos vividos, por
exemplo, em uma comunidade de pescadores artesanais? Ah, se a
comunidade começar a se transformar e se organizar, pode ter certeza
que certamente haverá algum Pai pronto para sabotar o processo de
esclarecimento e aprimoramento da consciência. Hoje um mano desabafou no facebook que seu pai havia saído já
fazia 15 anos pra comprar cigarros. Um dia de dor e amargura, pra
ele. Eu lhe disse sobre Darcy Ribeiro, que dizia ser feliz por ter
perdido o pai cedo e nunca ter tido filho, pois não lhe pesou uma
voz autoritária que quisesse lhe doutrinar, de modo que ele nunca
precisou doutrinar ninguém. Quem dizia isso era o próprio Darcy,
uma das pessoas que mais contribuiu para a educação do povo
brasileiro. Ele, que contribuiu muito com a pesquisa antropológica
no Brasil, já dizia que o povo brasileiro é muito mais indígena do
que se supõe.
Eduardo Viveiros de Castro, o maior estudioso dos povos indígenas da
atualidade nos diz “O homem livre da ordem escravocrata, para usar
a linguagem da Maria Silva Carvalho Franco, é um índio. O caipira é
um índio, o caboclo é um índio, o camponês do interior do
nordeste é um índio. Índio em que sentido? Ele é um índio
genético, pra começar, apesar disso não ter a menor importância.”.
A ideia central é a de que “no Brasil todo mundo é índio, exceto
quem não é.”. E estamos sendo, de muitos modos, fisicamente e
culturalmente atacados.
A Escola, se implementarem o “Sem Partido”, servirá somente para
produzir uma massa de manobra útil, distante da realidade,
amedrontada e sem capacidade de imaginar e empreender estratégias de
melhorias para seu próprio bem-estar. Este e outros ataques ao
sistema educacional terão um poder devastador em nossa sociedade. E
é isso que vamos colher se protegermos a concepção de Pai Dono da
Razão. Um professor que sabe escutar seus alunos em suas angústias
e conflitos não os oprime, e sim os liberta de concepções de mundo
unilaterais. Não só não há necessidade de um cartaz alardeando
deveres absurdos, como o tal texto do cartaz é uma clara incitação
ao conflito entre pais e professores. Os pais deveriam confiar no
professor, no conhecimento deste profissional. Estarem dispostos a
aprender com a escola, mas não só. Os pais deveriam confiar mais,
sobretudo, na Luz de seus filhos, e aprender com eles. E olha que
isto que estou dizendo – escutar as criancinhas – é o tipo de
ensinamento que está presente até na Bíblia.
UZI é um dos principais grupos de RAP de Londrina, e atualmente é formado pela dupla de poetasbeatmakers Thales e Makalé. Dia 21 de junho, sincronizado com o solstício de inverno, a dupla lançou seu terceiro disco: Deuzis (Solstício de Verão, Vol.1). Um disco foda, que merece ser escutado com atenção, e que segue no caminho de amadurecimento do RAP londrinense.
Sempre digo aos alunos que "cancionista esperto não compõe canção, compõe repertório".
Enredar canções. Jornadas de projeções nos personagens durante os textos.
São muitos os exemplos,
dos shows do Caetano Veloso aos discos clássicos de RAP,
a questão é que a conexão entre as canções
vai potencializando a capacidade de concentração e imersão
nos mais diversos universos poéticos.
Duas canções do disco já haviam sido lançadas, Tato e Testamento. A conexão entre elas, que na forma de RAP é sutil (faixas 3 e 8 do álbum), na forma de videoclipes fica explícita.
Quando o Criolo lançou o lyricvideo do "Duas de Cinco", eu pensei mesmo que essa forma pra canção era uma ideia fantástica. Vídeo de texto pro RAP é uma forma de produção mais barata (comparada à interação da canção com o clipe) e que potencializam ainda mais as escutas (texto de rap sempre tem muuuuita informação). Enfim, de lá pra cá eis que a forma tem se popularizado cada vez mais. Ó só, o Síntese lançou um disco abençoado, inteiro com lyricvídeo. O RZO lançou esse vídeo de texto aqui tb. E o Haikkais chuegou chutando o balde da ostentação e mostraram todo seu poder bélico (de rimas e meio$ de produção cultural) com um projeto monstro pra cada uma das faixas de seu último álbum.
O Thales e o Makalé presentearam Londrina com o primeiro disco pé vermelho lançado inteiramente com lyricvideo e no youtube. Isso não é pouca coisa, pra quem faz parte da cena local e percebe que, com nossos irmãozinhos entrando no game, todo o coletivo é quem ganha. Escutem aí:
Vou colocar aqui o texto de apresentação onde os caras falam sobre o disco:
"É com muito orgulho e alegria que compartilhamos com vocês a primeira parte do disco Deuzis - Solstício de verão.
Esse projeto foi iniciado ha muitos anos atras enquanto éramos em 4 integrantes. Com a saída de 2 deles e um processo de amadurecimento musical, técnico e espiritual, demos continuidade ao projeto, colocando uma nova identidade com a nova formação.
"Deuzis" é a concepção que temos como indivíduos espirituais em evolução, convivendo com as adversidades da vida.
A escolha do nome e da data tem um significado místico, tratando da dualidade.
Hoje, no hemisfério sul, no dia em que sol incide no ponto mais inclinado da terra, apresentamos pra vocês o resultado desse trabalho. Esperamos que gostem! Não esqueçam de compartilhar com os amigos.
Nos vemos em Dezembro!"
Gosto muito de como o disco se inicia, com "Reino". Uma ótima canção de abertura, que apresenta as intenções e perspectivas gerais da dupla. O Thales inicia e de cara aborda uma das questões centrais do disco, e do contexto que nos cerca: a ostentação: pra além das ilusões do ego, um marcador de caminho: "Eu fui vilão pela máquina de fazer frustração, e hoje máquina de fazer dinheiro/ liga lá no ministério da fazenda/ e descobre o mistério da minha renda". A reflexão prossegue, e desemboca no refrão "eu tô pro hip-hop como o hop tá pro hip, como o rock tá pro hippie e eu dô meu sangue". Aí, quando o Makalé começa, a viagem ganha um tom fantástico e existencial. Um relato de abdução. É o mesmo símbolo que aparece na canção seguinte, "Alquimista", que consiste no lance de observar as coisas de um lugar mais elevado ("Eu subi no monte Sinai...").
Depois de dois sons novos, aparece a canção Tato, que já era conhecida do público (mais de 49.000 visualizações no youtube). Não vou ficar aqui dizendo tudo que eu curti no disco pois acho que não compensa, o lance é vc dar o play várias vezes e topar as reflexões. Mas antes de abandonar este texto, acho que compensa deixar registrado que o trecho que eu mais curti foram as faixas 4 e 5: "Cela Fria" e "Recepção". Na primeira temos uma crônica diretamente da guerra urbana. E, se acaso o ouvinte se espante com tão elevado nível de violência, a faixa seguinte vem pra pontuar a inegabilidade da guerra que vivemos. Em "Recepção" temos registrado a chacina ocorrida em janeiro do ano passado, aqui em Londrina. A montagem do som do UZI se utiliza do mesmo recurso de "A Praça", do último disco dos Racionais MC's, em que Edi Rock narra a violência policial durante um show do grupo. Mas lírica do grupo londrinense não é uma cópia. A relação dos versos com os áudios de reportagens sobre a chacina em Londrina não é direta. O que temos são contundentes pontos de vista de personagens que vivenciam a referida guerra urbana.
E entramos no Solstício de Inverno agora. Cê vê? Tanta coisa nessa semana, gente?
O pessoal do UZI lançou, sincronizado com o movimento da terra ao redor do Sol,
um puta disco foda, chamado Solstício de Verão, Vol.: 1. Escrevo depois sobre isso. Logo tem show...
Festinha junina de quebrada (no Antares)...
E vc's lembram do tio Fuca?
Claro né!?
É aniversário dele hoje!
Quer dizer que ele nasceu nesse lugar do sistema solar.
Quem faz aniversário no mesmo dia é contemporâneo espacial, entendem?
Como vc's e o tio Pedro José
que também toca guitarra no Caburé...
tem tb o tio Herbert Proença, que também faz poesia, livreto e é ator...
vc's são contemporâneos siderais...
tem até um som do Caburé Canela, que é uma parceria do Pedro e do Herbert,
que foi muito muito muito bom de escutar e cantar no calçadão na terça
durante a paralisação que as universidades fizeram para enfrentar o Richa
a canção se chama Lixos Espaciais, e tem um refrão que diz:
"nada a temer" ... ai, ai... nada a Temer!
E aí, no dia do aniversário do Rafael Fuca, que é hoje,
o Abacate Contemporâneo faz show no Bar Valentino!
Vamos escutar o EP pra chegar lá conhecendo melhor as músicas?
Aí depois do show, vcs dão os parabéns para eles...
Sim, vc's conhecem quase todos da banda... ó, tem o pai do Cauê e da Iara
tem a mãe do Bentinho... viu!? vamos!?
A primeira canção chama-se "Rita Lina". O texto que a Raquel canta é uma poema/brincadeira de uma amiga que não está mais morando em Londrina. A Fernanda Lina. Muito, muito amiga da Thaty e da Dandara também. Perguntem a história do poema que a Dandara conta pra vc's, ela lembra de quando a Fer escreveu. Ritalina é o nome de um remédio que a indústria farmacêutica, junto com os médicos, dão pras crianças que dão trabalho pros professores. Percebem? Claro que não são só crianças que tomam esse remédio, que é uma droga. Sim, muitas drogas são permitidas, mas maconha é proibido. Entendem? Por isso tanto RAP, meus filhos... enfim, depois dos versos "Pula, pula amarelina", o Otto lembrou de outra coisa, e cantou: "Essa fogueira já queimou meu amor", no que o Ravi disse que era música de festa junina, "Pula a Fogueira". Estão aprendendo na escola? Deixa eu escutar no youtube... Legal, acho que tem a ver sim, gente, vou colocar isso no texto e vamos assinar juntos, Ok?! Ok. Pula a fogueira junina, pula, pula amarelina.
A segunda é uma canção do tio Binho. Tá escrito aqui, entre parênteses (Eber Prado). Viram?
O Fuca, o Binho, a Raquel e o Marcus são professores também, sabiam?
É. Muitos dos músicos da cidade se formaram no curso que o papai dá aula, na UEL.
E como o curso é de Licenciatura, quer dizer que forma músicos/professores. Tenderam?
A música do Eber, que é professor de Geografia, ele não fez o curso de música, mas estudou na UEL tb, a música dele chama-se "Louca de Pedra". Curtiram principalmente os solos de guitarra e a palavra "pira", do refrão. Vou escrever isso tb, podem deixar. Tem a ver sim com o clímax melódico, sabiam? Percebam como a palavra é estraçalhada pela melodia, pela forma de cantar. Fica até "pirÁ", não "pira". Isso se chama "prosódia".
"Arca de não é" é o nome da outra faixa, que é uma composição do Fuca. Essa é uma das que eu mais escutei desse disco. Lembro de tocar com o Rafael em várias ocasiões essa música. É, na casa dele, na minha, na do Piau, que é um outro professor lá da UEL... enfim, adoro esse texto, que parece besta, mas não é. Na sequência escutamos "Mais pra Abacate", outra composição do Fuca. Otto e Ravi curtiram algumas palavras soltas, "besta", "bicho pega", "chuchu" e "papaia".
"Amarelou" é uma canção feita pelo Farinha, que é o baterista.
Lembraram rapidinho, pois no último fds o Farinha comprou uns folhetos meus e trocamos mó ideia, enquanto vc's brincavam no canteiro em frente ao mercado Shangri-lá. Ah, aí o Ravi lembrou de um som, que diz que não se pode "Amarelar". O Otto já emendou cantarolando, "quem tá na linha de frente, não pode amarelar". Sim, esse som é do Criolo. A música escrita pelo Farinha é uma tiração de zarro na cara de quem "se diz muito bom", mas na hora que os desafios aparecem a pessoa foge.
E na última faixa, chamada "Insonia", o Ravi disse convicto que era a que ele mais havia gostado. Notei que esse gosto se deu por conta da música mesmo, não de qualquer relação com o texto. O Otto também disse que gostou muito do som. Gostaram do peso, do som forte. Nas palavras do Ravi, do som "alto". Expliquei que a palavra altura dizia sobre se o som era agudo ou grave... "Então tá, eu gostei do som fooorte, com guitarra e bateria!", completou o Ravi.
É o Rock, meus filhos.
É a energia do Rock que flui pelas veias de Londrina, molecada!
Ontem foi lançado o vídeo/canção "Demarcação, já!". Com um texto de tanta beleza explícita, como o do mestre Carlos Rennó, e com a concepção musical primorosa de outro grande mestre da canção brasileira, Chico César, se eu ficar escrevendo aqui vou só disTrair sua escuta. O time de intérpretes é primoroso, e sustenta a atenção desta canção/vídeo de mais de 14 minutos. As estrofes, de régua e compasso ousadíssimos, parecem feitos para cada um dos cancionistas convidados.
Escuta aí!
Esta é a segunda grande canção da dupla Carlos Rennó e Chico César sobre o tema. A primeira foi cantada por Chico em plena dos deputados, em 2015. Reis do Agronegócio é outro belo exemplo de como nossos cancionistas estão reagindo com vigor aos desmandos dos últimos tempos.
Escuta essa também.
Mas se sua escuta parar na contemplação de tão rica criatividade, ainda não é hora de afrouxar seus ouvidos pensantes. Tanta mestria assim nesses cancionistas está aí berrando algo que é muito mais urgente e real que a fina flor de nosso ofício. São profundos conflitos sociais que nós estamos vivendo, agora, neste exato momento. Tá sabendo, né!?
Do dia 24 (ontem) até o dia 28 estará ocorrendo o acampamento Terra Livre, onde indígenas de todo o país se reúnem sob o grito Demarcação, Já!
E, como já era esperado, a repressão já começou.
Acompanhe mais em Mobilização Nacional Indígena.
Nos preparativos pra grande festa popular de nosso país
o Carnaval. A festa da carne.
O desmonte das possibilidades de existência digna pra geral
neste desgoverno que anda o país. E o mundo.
Babylon will fall down.
Ou não.
Sei lá...
Sei que Tom Zé trabalha revelando a hipocrisia nossa de cada dia
faz tempo. E continua vivo, atento e compondo.
Um dos meus exemplos de velhice.
Eu disse no título "canções de resistência"
e é isso mesmo. Num momento em que a coerência é escassa
e a crise se encrespa. Onde o golpe foi forjado dentro do grande teatro
televisivo. Global.
Tom Zé articula consciência com qualidade estética.
E consegue ecoar inclusive dentro do O Globo.